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50. Democracia no Brasil
50. Democracia no Brasil

 

Experiência Democrática: 1945 – 1964

 Após a queda de Getúlio, os militares e a oposição liberal, decidiram entregar o poder transitoriamente ao presidente do Supremo Tribunal Federal. No contexto, parecia que o brigadeiro Eduardo Gomes – em campanha ao Governo Federal – ia em franca expansão, enquanto a de Dutra marcava passo. A campanha do brigadeiro atraía setores da classe média em torno da bandeira da democracia e do liberalismo econômico. Nas vésperas das eleições, Getúlio acabou por fazer uma declaração pública de apoio à candidatura de Dutra. As eleições de 1945 despertaram grande interesse na população: os brasileiros formaram longas filas para votar. Numa época em que não existiam pesquisas eleitorais a oposição foi surpreendida pela nítida vitória de Dutra.

 

O resultado mostrou a força eleitoral do PSD e o prestígio de Getúlio entre os trabalhadores. A votação do PCB (Partido Comunista do Brasil), de modo já legal, foi bastante expressiva. Os comunistas se beneficiaram de Luis Carlos Prestes. Já Getúlio, beneficiando-se da lei eleitoral, elegeu-se deputado e senador por vários Estados – optando por ser senador pelo Rio Grande do Sul. No processo eleitoral importavam mais as relações pessoais clientelistas. A opção partidária não tinha significado na vida cotidiana dos eleitores e era abstrata demais para ser apreendida por pessoas de educação rudimentar. No fim de janeiro de 1945 Dutra tomou posse e começaram os trabalhos da Constituinte. Este presidente optou pelo figurino liberal-democrático. Pela constituição o Brasil foi definido como República Federativa de governo presidencialista – este cargo eleito por voto direto e secreto por um período de 5 anos, mas só votavam brasileiros alfabetizados, acima de 18 anos. Ambos os sexos votavam, tornando clara a igualdade política entre homem e mulher. Sobre a questão da Ordem social e econômica, na constituição, estabelecia que eram importantes os critérios de aproveitamento dos recursos minerais e de energia elétrica. Sobre a família, a Constituinte deu vida a longos debates. Com a pressão da Igreja, o divórcio foi banido e definido que a família se constituía pelo casamento. Outra medida importante foi o reconhecimento, em certas atividades trabalhistas, do direito de Greve.Foi no governo de Dutra que começou a repressão ao Partido Comunista. Em maio de 1947, sob o medo da guerra fria, o Supremo Tribunal Federal decidiu cassar o registro do Partido Comunista. O Ministério também fechou uma central sindical controlada pelos comunistas. Anos depois, uma lei aprovada no congresso determinou a cassação do mandado dos deputados, senadores e vereadores eleitos pela legenda comunista. O governo Dutra iniciou seguindo o modelo liberal, pois a situação do Brasil no plano financeiro era favorável, visto que o país acumulava divisas no exterior, resultantes das exportações nos anos de guerra. Apesar disso a política econômica fracassou. Neste período, houve um estímulo às exportações e à produção para o mercado interno.  Em seus últimos anos o governo Dutra alcançou resultados expressivos, mas ocorreu uma redução dos salários.

 

Com o passar dos anos as manobras para a sucessão presidencial começaram antes de Dutra completar seu mandato. Neste sentido, Getúlio aparecia como um pólo de atração. Em São Paulo, apoiado pelos comunistas, Ademar de Barros elegeu-se governador no ano de 1947. Ademar montou o Partido Social Progressista. Este governador era odiado pelos partidários da UDN, que insistiam no tema da moralidade, atraindo assim elementos das camadas populares e parcelas da pequena e média burguesia. Neste contexto de ascensão de Vargas Dutra negou-se a apoiá-lo. Já a UDN voltou a apresentar o nome do brigadeiro Eduardo Gomes. No limiar das eleições, Getúlio baseou sua campanha na defesa da industrialização e na necessidade de ampliar a legislação trabalhista. Nestas eleições, em 1950, Vargas obteve uma grande vitória e tomou posse. A UDN tentou repugnar o resultado das eleições alegando que só poderia vencer o candidato que obtivesse a maioria dos votos válidos. Getúlio tentou ser arbitro diante das diferentes forças sociais e políticas querendo atrair a UDN. Do ponto de vista partidário, os nacionalistas defendiam o desenvolvimento baseado na industrialização, na necessidade de criar um sistema econômico autônomo, independente do sistema capitalista internacional. Isto significava dar ao Estado um papel de regulador da economia e investidor de áreas estratégicas: petróleo, siderurgia, transportes, comunicações. Já os adversários dos nacionalistas defendiam uma menor intervenção do Estado na Economia e que era preciso abrir, com controle, o capital estrangeiro. Sustentavam que era necessário combater a inflação por meio do controle da emissão de moeda e dos gastos do governo.

 

No início da década de 1950, o governo promoveu várias medidas para o desenvolvimento econômico, enfatizando a industrialização; mas o governo se via diante de um problema: o avanço da inflação. Neste contexto, Getúlio foi forçado a manobrar num mar de correntes contraditórias: de um lado as reivindicações dos trabalhadores; de outro o controle da inflação. Este presidente nomeou o jovem João Goulart para o ministério do trabalho. Este político ligou-se aos meios sindicais do PTB e surgiam como alguém capaz de combater a influência comunista nos sindicatos. Jango foi transformado num personagem odioso pela UDN. Cumpre-nos dizer que desde o início de seu governo Vargas não esqueceu da base de seu apoio: os trabalhadores urbanos. Mas o governo não conseguiu controlar inteiramente o mundo do trabalho. A liberação do movimento sindical e o alto custo de vida levaram a uma série de greves em 1953. Para ter uma idéia, a greve paulista chegou a abranger 300 mil trabalhadores marceneiros, carpinteiros, operário do calçado, gráficos e vidreiros. Além disso, a greve dos marítimos abrangeu cerca de 100 mil trabalhadores que solicitavam o aumento salarial, melhorias nas condições de trabalho e o afastamento da diretoria da Federação dos Marinheiros. Enquanto isso, Jânio Quadros, em São Paulo, baseou sua campanha ao governo estadual em um tom populista, contra a corrupção e tomando como símbolo a vassoura. Mas nos cenário nacional Jango era o alvo dos antigetulistas. Seu nome era associado aos planos de uma república sindicalista, pois cortejava o aumento de 100% no salário mínimo. Neste contexto, destacava-se também Carlos Lacerda com seu radicalismo e poder verbal.

 

O populismo e o comunismo eram seus alvos preferenciais. A partir de seu jornal “Tribuna da Imprensa” iniciou-se uma campanha pregando a renúncia de Getúlio. Entre os adversários do governo encontravam-se os oficiais anticomunistas. Próximo da queda de Getúlio, João Goulart deixava a imagem de um ministro que só queria beneficiar os trabalhadores. Em momentos de crise, o presidente adotou uma linha nacionalista na área econômica e responsabilizou o capital estrangeiro por problemas no balanço de pagamentos. Getúlio respondeu com o projeto de lei que criava a Petrobrás. O anúncio do aumento do salário mínimo, feito pelo referido presidente, provocou uma tempestade de protestos. Apesar das pressões e da falta de apoio Getúlio se equilibrava no poder. Faltava à oposição um acontecimento que provocasse a queda de Getúlio. Foi então que se planejou matar Lacerda, principal adversário do presidente. Mas a tentativa deu errado e, mesmo acusado, Getúlio dá uma reviravolta na história e resolve se suicidar, mudando o rumo dos objetivos da oposição. Na tentativa de homicídio morre o acompanhante de Lacerda, que fica apenas com um ferimento na perna. Antes de se matar, Getúlio Vargas entendia-se representar o princípio da legalidade constitucional. O suicídio de Vargas incidiu o desespero das pessoas, mas, para Getúlio, tinha um significado político. Após sua morte, a massa urbana saio a ruas.

 

O vice-presidente Café Filho assumiu o poder e formou um ministério com maioria udenista.Em campanha presidencial aparece o nome de Juscelino Kubtschek pelo PSD. A UDN lança o general Juarez Távora que insistiu na moralização dos costumes políticos. Kubtschek martelou na necessidade de avançar no desenvolvimento econômico. Em outubro de 1955 Juscelino obtém a vitória e João Goulart elegeu-se vice-presidente com maioria dos votos. Após a vitória, desencadeou-se mais uma tentativa de impugnação, mas Kubtschek assumiu o poder, depois de alguns conflitos, em 31 de janeiro de 1956. Seus anos de governo foram de estabilidade política, crescimento econômico e pelo sonho da construção de Brasília. Trata-se da campanha dos “cinqüenta anos em cinco”. Neste período vivia-se um interesse em combater o comunismo e manter a ordem. No exército havia dois grupos: de um lado os nacionalistas, alguns deles próximos dos comunistas; e de outro os purificadores da democracia, convencidos de que era preciso dar um golpe para se evitar a República Sindicalista. Mas nem todos os golpistas eram entreguistas.  O fato é que, ao iniciar o governo de Kubtschek a cúpula militar se acalmou. Juscelino começou a governar e promover o desenvolvimento e a ordem – objetivos compatíveis com as forças armadas. Tratou também de manter o movimento sindical sob controle e indicar militares para postos estratégicos. O acordo entre PSD e PTB garantiu os principais projetos do governo no congresso. Importante mencionar que o getulismo aproxima PSD e PTB.

 

Isso possibilitou a Kubtschek sintetizar os limites de ação desses dois partidos. A política de ação de Juscelino foi definida no Programa de Meta com 31 objetivos, divididos em seis grupos: energia, transporte, alimentação, indústria de base, educação e a construção de Brasília.  Neste mesmo período surgiu a SUDENE, cercada de esperanças para levar desenvolvimento industrial para o nordeste.O governo Juscelino Kubtschek promoveu ampla atividade do Estado no setor da infra-estrutura e no incentivo à industrialização. Mas o problema foi o custo deste desenvolvimento: atraiu-se capital e indústria estrangeiros concedendo grandes facilidades nas áreas prioritárias do governo – automobilística, transportes aéreos e estradas de ferro, eletricidade e aço. O resultado do programa de meta foi impressionante. A indústria d automobilística concentrou centenas de operários na região do ABC paulista e representou grande êxito tentando criar uma ‘civilização do automóvel’. Mas o governo não investiu em meios de transportes públicos nem em estrada. Na memória coletiva, o governo de Kubtschek é lembrado pelo otimismo associado às grandes realizações, cujo exemplo é a construção de Brasília, que, aliás, na data simbólica de 21 de abril de 1960 foi inaugurada por Kubtschek como Capital Federal. Mas nem tudo foi flor no período de Juscelino Kubtschek. Existiam problemas na área do comércio exterior e nas finanças. Os gastos para sustentar a industrialização e a construção de Brasília ocasionaram déficit na economia e declínio do intercambio. Além disso, eram várias as razões do declínio da inflação: gastos governamentais excessivos, aumento salarial do funcionalismo; juros do crédito privado... É importante salientar que a inflação representava um excelente negócio para alguns setores sociais e econômicos. Some-se a isso o fato de que o plano de metas não prever grandes sacrifícios. Sua aplicação resultou em reações contrárias. Neste período também se tentou implantar um programa de estabilização econômica, mas dependia do Fundo Monetário Internacional. De muitos conflitos, temos o resultado do rompimento com o FMI – o que resultou num forte apoio de setores da sociedade a Juscelino. Neste contexto, o PCB ia encontrando canais de expressão, apesar de continuar formalmente na ilegalidade.No final de 1959 surgiram as candidaturas. Jânio Quadros foi lançado pelo pequeno partido com o apoio de Lacerda. Na corrida presidencial Jânio criticava a corrupção do governo e a falta de ordem.

 

Ele atraía o povo com sua figura popularesca. Apesar não se enquadrar no figurino bom comportado da UDN em novembro de 1959 essa legenda convencionou apoio a Jânio Quadros, afinal este candidato reunia as esperanças da elite antigetulista, da classe média que queria a moralização dos costumes e que sofria com o alto custo de vida. Outro candidato foi o general Lott – político desastroso que personificava a continuidade da política democrática, mas falava mal em público e tentava assumir artificialmente as idéias getulistas. Em outubro de 1960 Jânio Quadros venceu as eleições e João Goulart, mais uma vez, é eleito vice. Em Brasília, pela primeira vez, um presidente assume o poder na nova Capital, encarnando as esperanças do futuro. Jânio começou a governar de forma desconcertante: proibiu o uso de lança-perfume, biquíni e briga de galo. Combinou iniciativas simpáticas à esquerda com medidas agradáveis aos conservadores. Mas Jânio Quadros desagradava a ambos os lados. Certa vez, ao retornar de Cuba, Che Guevara fez uma escala em Brasília e foi condecorado pelo presidente. No plano financeiro Jânio optou por um pacote ortodoxo de estabilização, prevendo desvalorização cambial, contenção de gastos e expansão monetária. Para tais circunstancias, foram tomados novos empréstimos junto aos EUA. Em 1961 Jânio Quadros começou a afrouxar as medidas de contenção de gastos e vinha administrando o país sem base política de apoio. Ele agia sem consultar a liderança udenista no congresso. Além disso, a simpatia presidencial pela reforma agrária preocupava. Sem justificar ou dar uma versão clara dos fatos, Jânio renuncia. Ele esperava obter, com um lance teatral, mais apoio para governar, livrando-se do Congresso e dos partido. Jânio se julgava imprescindível para o Brasil. Seu plano fracassou. Mas havia um problema: os conservadores não queriam que João Goulart e a constituição não deixava dúvida de que João – apear de está na China – deveria assumir.

 

Os ministros militares de Jânio vetaram a volta de Goulart ao Brasil, por razões de segurança nacional. Mas a figura principal do movimento que pedia a vota de Jango foi Brizola. Ao final deste impasse o congresso adotou uma medida importante: definir o Brasil como parlamento, pois assim era possível reduzir os poderes do presidente.Ao iniciar o governo de era claro o avanço dos movimentos sociais e o surgimento de novos atores. Houve uma grande mudança estrutural caracterizada pelo crescimento urbano e rápida industrialização. Neste período as migrações aproximaram o campo da cidade. Jango sancionou a lei dispondo sobre o Estatuto do Trabalhador Rural: começou a ter carteira profissional, regulação do trabalho, observância do salário mínimo, repouso semanal, férias... Cresceu também a participação dos estudantes através da UNE. Já a Igreja católica se dividiu entre ultraconservadores e esquerdistas. O fato é que a posse de João Goulart no poder significou a volta do esquema populista. Jango delineou as reformas políticas denominadas de base que abrangiam reforma agrária e urbana. No que se refere à política, Jango defendia o direito de os analfabetos votarem e dos oficiais inferiores das forças armadas. O presidente também defendeu maior intervenção do Estado na Economia, além da nacionalização das empresas concessionárias dos serviços públicos, frigoríficos, farmácias, petróleo, etc. As reformas de base não se destinavam a implantar uma sociedade socialista. Era uma tentativa de modernizar o capitalismo e reduzir as profundas desigualdades sociais. Diante desta política, as direções sindicais foram fiéis ao esquema populista. Neste sentido, três fatores podem ser assinalados nos movimentos grevistas: a) aumento do número de greves; b) paralisações no setor público; c)deslocamento das greves, de São Paulo para outros lugares. O crescimento das greves indica o avanço da mobilização social. Mas, enquanto o governo federal se abria aos sindicais, o governador de São Paulo – Ademar de Barros – reprimia duramente as greves. No governo de João Goulart as divisões entre os partidos eram enormes, principalmente em relação às diferenças ideológicas. No contexto mundial, constata-se uma crise da esquerda e do stalinismo.

 

Desta situação nasceu o Partido Comunista do Brasil (PC do B) que encontrou na China o suposto modelo de fidelidade aos princípios marxistas. O medo da guerra revolucionária no comunismo fez surgir à doutrina da segurança nacional. Esta tensão provocou o nascimento da Escola Superior de Guerra (ESG) com a assistência de conselheiros franceses e americanos. Os cursos desta escola eram abertos a civis. À medida que o governo de João Goulart se radicalizava e se estabilizava, firmava-se a idéia de que só um movimento armado poria fim à anarquia populista, contendo o avanço comunista. Já dissemos que o regime instaurado foi o parlamentarismo que, aliás, deveria ser votado em plebiscito m 1965. Todos sabiam que este regime governamental representava um arranjo para limitar o poder de Jango. Neste sentido, a cúpula militar inclinava-se por um golpe executivo fortalecido. No plebiscito milhões de pessoas disseram ‘não’ ao parlamentarismo. Goulart assume, com plenos poderes, a presidência, mas a situação financeira era grave. Aumentava-se a inflação e os problemas eram tantos que só uma revolução poderia purificar a democracia, pondo fim à luta de classes, ao poder dos sindicatos e aos perigos dos comunistas – estas eram as idéias dos opositores de Goulart. Com apoio nos dispositivos militares Jango deveria contornar o Congresso, começando a fazer isso por decreto a reforma de base. João Goulart reunia grandes massas em uma série de atos onde enunciava reformas. É verdade que só ficava no papel e no discurso.

 

Numa certa ocasião Jango assinou dois decretos: o primeiro (simbólico) desapropriava as refinarias de petróleo que ainda não estavam sob o domínio da Petrobrás; o segundo – chamado de decreto da Supra – declarava a desapropriação de propriedades subutilizadas. Neste mesmo ato o presidente anunciou também que estava em andamento a reforma urbana. Este primeiro ato marcou o início do fim de seu governo. Como resistência, veio à marcha da família, com Deus, pela Liberdade, em São Paulo organizadas por senhoras católicas ligadas à igreja conservadora. Em 31 de março iniciaram a implantação do golpe, mas em 1º de abril Goulart foi para Brasília e evitou qualquer ação que fosse sangrenta. Na noite deste mesmo dia o presidente do Senado declarou o cargo Executivo como vazio – o poder, na verdade, já estava nas mãos dos militares que pretendiam permanecer pouco tempo no governo. O que não ocorreu. Os militares assumiram o regime autoritário para manter a ordem social, o respeito à hierarquia e o controle do comunismo.